10 obras-primas do “metal industrial”
Os anos 90 foram a grande década do “metal industrial” iniciado no final do decénio anterior – registando uma das mais poderosas combinações de violência, agressividade e poderio da história do “rock”. Ao fundir as velhas guitarras do “rock’n’roll” com a parafernália de estúdio, em muitos casos unidas a marteladas de “drum machine”, as sonoridades refletiram o caos distópico da era “cyberpunk” – com uma crença muito pouco empática na tecnologia, que aparece ligada à manipulação, controles corporativos e desumanização. O “glam metal” descerebrado destes tempos, que já sofria com a ascensão do “thrash”, passou de vez à História.
MINISTRY “Burning Inside” (Álbum: “The Mind Is a Terrible Thing to Taste”, 1989)
Antes de potencializar o efeito das máquinas no “rock’n’roll” mais “standard” (ver faixa a seguir), Al Jourgensen e Paul Barker criaram o ainda mais agressivo “The Mind Is a Terrible Thing to Taste” – álbum de uma eletrónica violenta, crua e impiedosa. “Burning Inside” conta com todo o tipo de bruxaria de estúdio, com guitarras e vocais saturados de efeitos para receber uma “drum machine” que parece vinda diretamente do inferno – previsivelmente do interior da mente colapsada de Jourgensen – literalmente a queimar por dentro.
MINISTRY “N.W.O.” (Álbum: “Psalm 69“, 1992)
Um Dennis Hopper saído de “Apocalypse Now” tenta manter a calma nos primeiros segundos (“It ‘s alright! It ‘s alright!”) – pouco antes de desabar uma hecatombe sonora que demonstra todo o poderio das guitarras eletronicamente modificadas, uma batida repetitiva alucinante e uma pulsação que marca o passo de uma realidade entregue a “nenhuma ordem”. O caos das selvas das Filipinas onde Coppola famosamente fez o seu filme transporta-se para o desastre urbano do caso Rodney King (1992) – cujas imagens de protesto nas ruas de Los Angeles tomavam os noticiários daqueles tempos e foram parar no vídeo desta “nova ordem mundial” (expressão sarcástica e inspirada no pouco saudoso George Bush pai).
NINE INCH NAILS “Head Like a Hole” (Álbum: “Pretty Hate Machine“, 1989)
No mesmo ano que o Ministry lançava um dos seus álbuns fundamentais e que praticamente definiam esse sub-género, Trent Reznor, não fazia por menos e o tempo o veria a sobreviver criativamente melhor que Al Jourguensen – entre outros projetos como requisitado construtor de bandas sonoras. Neste caso uma adrenalínica diatribe contra o “establishment” e o “Deus dinheiro”, perante o qual todos se ajoelham. Na paisagem sonora, a sua forma particular de combinar eletrónica e a fúria do “rock”.
GODFLESH “Like Rats” (Álbum: “Streetcleaner“, 1989)
Menos famoso, mas igualmente de relevo, o duo de Birmingham fecha com o Ministry e o Nine Inch Nails a santíssima trindade dos fundadores do “metal industrial” num ano particularmente exuberante para o sub-género. “Streetcleaner” traz, possivelmente, a coleção de sons mais violentas deste “top” – logo abrir com essa potente amostra calcada em guitarras sujas e distorcidas enquanto o vocal cavernoso de Justin Broadrick vocifera…”breathe…like rats!”
FEAR FACTORY “Self Bias Resistor” (Álbum: “Demanufacture“, 1995)
Embora talvez calhe ao Skinny Puppy a taça de paisagem sonora mais inóspita desta lista, o Fear Factory trilha caminhos bem diferentes das melodias, ainda que violentas, de outros expoentes encontrados por aqui. O resultado é um som robotizado, seco e brutal, onde o vigoroso protagonismo da “drum machine” mescla-se com os elementos humanos para um verdadeiro reflexo dos temas que se espalham por “Demanufacture” – a desumanização e o controle automatizado num registo certamente distópico.
KMFDM “Light” (“Angst“, 1993)
Voltando para lides mais palatáveis, com uma guitarra “peganhenta” e onde a voz feminina contrapõe com ironia as declarações de intenções e o “treat for freaks” do cantor Sascha Konietzko e a sua voz grave: “In a world of deceit, open your eyes / What we do for you, so good for you / Don’t be afraid and you’ll realize /nWhat you do for me, so good for me”. A banda de Frankfurt foi particularmente bem-sucedida nos Estados Unidos.
MARILYN MANSON “Beautiful People” (Álbum: “Antichrist Superstar“, 1994)
Coube a Marlylin Manson carregar para o “mainstream” um universo de submundos patologicamente provocadores e anexar todas as rebeliões e heresias particularmente imputáveis ao “antichrist superstar”. Ninguém aproveitou melhor todas as possibilidades de encarnar o Mal Supremo – e “Beautiful People” é deliciosamente violenta – onde quem acaba por reinar é o próprio vocal de Manson, numa postura teatral que o movimenta entre o “falsetto” e o sussurro.
WHITE ZOMBIE “More Human than Human” (Álbum: “Astro-Creep: 2000“, 1995)
Incrivelmente divertida e entusiasmante, esta faixa de White Zombie e o seu louco imaginário dos “b-movies” e “comics” (e sexo) quase transformou o “metal industrial” em qualquer coisa que se podia dançar, embora alguém os também sentenciados como pioneiros do “nu metal”. Decidindo, curiosamente, terminar funções quando atingiram o seu auge com este “Astro-Creep 2000” e esta que é o seu maior “hit”, Rob Zombie imigrou para o terror “trash” no cinema, o qual também funcionaria muito bem às suas pretensões artísticas.
Skinny Puppy “Pro Test” (Álbum: “The Greater Wrong of the Right“, 2004)
Decididamente a banda mais “desagradável” desta lista no que concerne a melodias afáveis – a abertura de um dos seus álbuns mais icónicos (“Too Dark Park”) chama-se precisamente “Convulsion”, uma cacofonia com todo o tipo de sons imagináveis. Por aqui fica-se com a bastante mais acessível “Pro Test” (que os próprios chamaram ironicamente de ‘pseudo pop’ – que traz maior proximidade com o “metal industrial” de uma banda mais voltada para a eletrónica. O álbum de onde saiu, no entanto, está longe de facilitar a vida de quem não se dispuser a entrar num mundo de “techno” experimental e sem maiores preocupações para aparecer nos “tops”.
RAMMSTEIN “Engel” (Álbum: “Sehnsucht“, 1997)
Por fim, mas decididamente não menos importante, esta “Engel” (“anjo”, em alemão) parece verdadeiramente angelical para encerrar o pandemónio. Não que este voo sobre esses seres alados em busca de humanidade (curiosamente o mesmo tema do conterrâneo Wim Wenders no seu “Céu sobre Berlim”) não se sustente nas guitarradas vibrantes – contrabalançadas por um assobio de faroeste e pela ironia cantada pelo coro feminino: “Somente quando as nuvens dormirem / Podemos ser vistos no céu / Nós temos medo e estamos sozinhos”. Pobres anjos.