Oscars 2022: mas, afinal… que filmes são estes?

Oscars 2022: mas, afinal… que filmes são estes?

Março 27, 2022 0 Por admin
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Enquanto diferentes artigos têm sido postados a propósito dos filmes dos Oscars, complementada com uma análise sobre a sua relevância mercadológica e cultural, surge outra questão mais genérica: são as obras indicadas na categoria Melhor Filme relevantes? O crítico do Cultura XXI e editor do “blog” Cinematograficamente Falando Hugo Gomes parece achar que não – e assina essa crónica que queria batizar de “Irritação com os Oscars…”

Por Hugo Gomes

Ano após ano tenho presenciado ainda mais a queixa do – “que filmes são estes? Eu não os vi, nem nunca ouvi falar deles!” – em relação aos nomeados à categoria principal. Há uma ideia de que as nomeações dos Óscares devem ir ao encontro do anterior conhecimento geral do público, essa futura audiência da cerimónia, como se seguisse de perto as campanhas de “marketing” e os “lobbies” que abundam e tresandam na “award season”.

Os Óscares funcionam, e continuam a sê-lo, como um selo de “qualidade” que impulsionam novos números de “box-office”, é uma tendência, que não se traduz no interesse da transmissão televisiva cujos números têm feito desesperar os organizadores.

Como tal, deparamos com ideias (muitas delas abandonadas) de implementação de um apelo popular, seja do Óscar Popular à votação de Twitter, o qual tem gerado caricatas hipóteses mas que em certa parte resumem o que é de facto o “lobby” da votação destes prémios.

Assim, faço a minha previsão: CODA vence, onde veremos a seguir um gigante do “streaming” (a Apple+) que bancou os direitos do filme a ser, por fim, legitimada. Então saberemos se será completado esse processo que tem sido visto como “ameaça” e mudará drasticamente a nossa definição de “majors” e todo esse círculo de poder vindo dos Grandes Estúdios. Se ganhar Power of the Dog, de Jane Campion, o cenário é o mesmo.

“Belfast”, um dos concorrentes a Melhor Filme

Prosseguem favoritismos, ora vemos Denis Villeneuve (Duna) e Adam McKay (Don’t Look Up) presente com os seus “sucessos” imediatos, as histórias mais velhas que o tempo como é o caso de Belfast (a infância proustiana a servir de mote para tratados autobiográficos) e King Richard a preservar o lugar ocupado da “grande” “biopic” americana, a masturbação da Hollywood de Ouro que nunca mais regressará (como é o caso dos filmes de Del Toro e de Spielberg – Nightmare Alley e West Side Story, respetivamente) e, por fim, o “underdog” demasiado artístico para o paladares destas audiências generalizadas, o qual se tenta replicar conquistas à lá Parasitas [Drive my Car].

Nesta última indicação gostaria de deixar a minha oposição à Academia Americana e invocar o discurso vitorioso de Bong Joon Ho de estatueta de Melhor Filme na mão: “quando ultrapassamos a barreira das legendas, acedemos a tantos magníficos filmes”.

Talvez seja essa a resposta à angústia dos Óscares, essa abertura, internacional digamos (até como ofensiva a uma indústria cada vez mais decadente e homogeneizada), mas também na perda dos preconceitos quanto a géneros e a abordagens. Novamente celebrar Cinema e não apenas “glamour”, se é que um dia os Óscares foram sobre o cinema propriamente dito.