Doclisboa 2022: “Les Harkis”
Com um começo de verdadeiro filme de terror (embora sem as possibilidades da graça “over the top” do género), o francês Phillippe Faucon inicia uma travessia no deserto pelo grande dilema dos “harkis” – uma história que, por si, diz muito não apenas da selvajaria da guerra como da selvajaria como dos maquiavelismos de quem mexe os cordelinhos.
A famigerada Guerra da Argélia (1954-1962), ainda hoje marcante como um dos mais brutais episódios de todo o processo de descolonização, reservou um capítulo à parte para os “harkis”, os quais Faucon apresenta com um caráter quase didático (a ficção em si, a encenação e a construção dos personagens é o grande ponto fraco do filme): essencialmente homens que, pela miséria absoluta ou por vingança, alinharam com os franceses contra o seu próprio exército de libertação.
Obviamente que o acordo para acabar a guerra assinado por De Gaulle lhes estabelece a sentença: impedidos de fugir para a França, previsivelmente muito pouco interessada em acolher argelinos, tampouco tinham hipótese de voltar para as suas aldeias – onde estavam certamente marcados para morrer como traidores.
Segundo os historiadores, milhares de “harkis” morreram – até que os franceses, muito lentamente e devido ao elevado número de matanças, os aceitou acolher a partir de 1969, onde eram colocados em guetos que só em 1976 foram abolidos.