Cannes 2021: uma pré-abertura “otimista” com a paixão pelo cinema de Mark Cousins

Julho 7, 2021 0 Por Roni Nunes
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Antes da seção de gala e da apresentação de “Annette”, ocorrida ontem (06/07), abrirem oficialmente os trabalhos da novíssima edição de Cannes, “The Story of Film: a New Generation”, de Mark Cousins trazia aos navegantes da Côte d’Azur uma espécie de cartão de visitas simbólico. Embora globalmente bem-recebido, também recebeu críticas interessantes que colocam em causa suas abordagens e conteúdos.

Essa edição do festival é emblemática de algumas maneiras. Em primeiro, surge num momento de algumas crises e incertezas: de um lado a pandemia, responsável pela não-realização do festival no ano passado, algo que não ocorria desde a 2ª Guerra Mundial; de outro o facto da crise sanitária afetar a experiência em sala – a qual, por seu lado, já vem sofrendo há alguns anos à pala de “streaming”, pirataria e visualização de filmes em novos formatos.

Por outras palavras, Cannes representa, como a própria insistência com a Netflix de que, para os seus filmes entrarem na Competição, tenham estreia garantida em salas francesas, uma celebração do cinema tradicional. E Cousins pareceu a Thierry Fremaux, o diretor, isso mesmo – conforme disse o cineasta a Deadline: “Ele me telefonou e disse que o filme se parecia com o ‘começo de Cannes’ (…) fiquei encantado que ele pensasse que isso seria algum tipo de lançamento da cinefilia”.

Otimismos

“The Story of Film – The Next Generation” tem 2h40 e divide-se em duas partes – uma mais focada em cinema de género e filmes mais conhecidos e a segunda mais dedicada a cinema experimental. Um dos grandes desejos de Cousins foi, algo também visível na sua obra escrita em livros como “História do Cinema”, uma abrangência global, um esforço de sair Já em termos estéticos procura ir a todo o lado: de “blockbusters” como “Joker” a pequenas peças de cinema “indie” como “Florida Project”.

Mark Cousins, como se sabe, tem vindo a ter uma exposição mediática considerável nos últimos anos em função das suas “histórias do cinema”. A primeira, “The Story of Film – An Odyssey”, lançada em 2011, tinha15 horas de duração – estabelecendo um formato que tem sempre a graça de serem formas dinâmicas, não académicas, de contar a história do cinema.

De resto, perguntei a Cousins há dois anos, em Sevilha, se em relação aos novos desafios ele era otimista, apocalíptico ou nenhuma das opções anteriores? Resposta: “Sou moderadamente otimista, pois acredito que a só as salas de cinema poderão oferecer certos tipos de emoções e espetáculos coletivos que façam com que as pessoas não queiram apenas a estar em casa a encomendar uma pizza e a ver filmes na televisão. “

Críticas

Cousins está habituado a receber críticas positivas, mas não só. Das negativas, destaque para a de Ángel Quintana, nas Ediciones Cayman Cuadernos de Cine. Segundo Quintana, o cineasta “… converteu-se para alguns num historiador modelo, quando a sua história sempre foi um compêndio de tópicos (…) Cousins realiza una especie de visão globada mesclando discursos e jogando com exemplos que funcionam de forma excessivamente indiscriminada, como se o exemplo fosse a chave de um discurso que nunca se concretiza…”

O crítica observa ainda que “o trabalho parte de uma premissa absolutamente equivocada: abordar o cinema contemporâneo como se este não estivesse em contato com as séries de televisão, os museus, o teatro e os telediscos. (…) Cousins parte de uma velha ideia ‘griffitiana’ de ‘linguagem cinematográfica’ sem pensar que estamos a falar de mudanças tecnológicas, de alterações no ponto-de-vista do espectador e no sistema de expressão como um todo”.