Cannes 2021, filmes: Sean Penn, Rússia, Croácia, Uruguai, Patagónia
“FLAG DAY”, Sean Penn (Seleção Oficial)
Com mais ou menos entusiasmo os críticos em Cannes têm acordado com o facto de que Sean Penn redimiu-se da má receção de “The Last Face”, vaiado na edição de 2017. Desta vez o ator/realizador retornou com um drama familiar no qual compartilha o protagonismo com a filha na vida real – Dylan Penn, fruto da sua relação com Robin Wright. Com uma carreira mais longa como modelo do que como atriz, Dylan encarna uma personagem inspirada na vida real de Jennifer Vogel. Esta, num belo dia, descobre pelos telejornais que o pai tinha desaparecido durante a liberdade condicional após ter feito um dos maiores estoques de dinheiro falso dos Estados Unidos. Com músicas de Eddie Vedder na banda sonora, aparentemente o filme tem uma composição plástica que os menos entusiastas referiram como “imagens de teledisco”.
“COMPARTMENT Nº 6”, Juho Kuosmanen (Seleção Oficial)
O realizador finlandês adaptou o romance homónimo da escritora Rosa Liksom, sua conterrânea. O livro tratava da viagem de uma mulher em fuga dos seus problemas que se impõe uma périplo pela Sibéria até a Mongólia. Kuosmanen reduziu o itinerário e a sua “road trip” leva a sua protagonista até Murmansk, cidade mineira localizada no norte da Rússia próximo à Finlândia. Ela é arqueóloga e lésbica; no compartimento do comboio que dá nome ao filme terá que conviver com um rude mineiro. Aparentemente a maior parte da ação se passa aí, entre um confinamento obrigatório que age no sentido inverso – empurrando os personagens em relação à uma abertura aos seus preconceitos e em direção ao autoconhecimento. Globalmente bem recebido em Cannes.
“MURINA”, Antoneta Alamat Kusijanoviç (Quinzena dos Realizadores)
Outra história de “coming-of-age” feminino encontra a protagonista encerrada numa família controlada pelo pai agressivo. Eles vivem numa ilha da Croácia, país da cineasta, e o fundo do mar é o único refúgio que a personagem encontra para livrar-se da asfixia caseira e reinventar-se. O título refere-se a um animal capaz de morder a si mesmo para livrar-se de um arpão. O filme tem dividido opiniões: enquanto para alguns críticos é um bom filme de estreia de Kusijanovic, outros não ficaram tão convencidos, como Marta Balaga do Cineuropa: “Todas essas interações soam autênticas? Não exatamente, apesar das caras interessantes do elenco, eles não ficam bem juntos. A ocasional telenovela e o balé debaixo d’água beira a tolice, também – afinal é bastante difícil expressar sentimentos com uma máscara de mergulho…” Tem coprodução da brasileira RT Filmes.
“THE EMPLOYER AND THE EMPLOYEE”, Manuel Nieto Zas (Quinzena dos Realizadores)
Drama uruguaio que centraliza-se na diferença de classes na zona rural, com coprodução da brasileira Vulcana Filmes. Globalmente bem recebido, situa a questão do poder mediante intricados laços familiares – quando as famílias de patrão e empregado têm de conviver após uma tragédia. O patrão, neste caso, é cercado de liberalidades, permanecendo, no entanto, um chefe de estância nos pampas uruguaios para o qual vem trabalhar um jovem condutor de tratores. Segundo Diego Battle, do Otrocines, “o certo é que Nieto Zas concebeu uma história com muito mais ramificações, facetas, conotações e alcances que uma esquemática luta entre um poderoso mau que abusa de um trabalhador humilde e bom”.
“THE TALE OF KING CRAB”, Alessio Rigo de Righi e Matteo Zoppis (Quinzena dos Realizadores)
Filme dividido em duas partes, uma passada em Itália numa região não muito longe de Roma e outra, embrenhando-se pela Patagónia adentro. Inspirado em folclores italianos e, pelo tipo de abordagem, remetendo alguns críticos a nomes com Pasolini ou Ermano Olmi. Definição de Diego Lerer, do Micropsia: “lenda italiana de príncipes, donzelas e bêbados, ‘western’ patagónico com ares ‘herzoguianos’ com marinheiros, mercenários e tesouros escondidos, é cinema em estado puro, selvagem, cheio dos mesmo sonhos românticos e as ambições épicas de seu alcóolico protagonista”.