A confusão da adolescência: crítica a “How to Have Sex”
Por André Gonçalves
A realizadora Molly Manning Walker já tinha preparado o terreno para um tratado sobre o (não) consentimento e o silêncio e conivência sociais na sua curta-metragem “Good Thanks, You?” de 2020 (disponível na MUBI Portugal). Mas “How to Have Sex”, vencedor do prémio Un Certain Regard da mais recente edição do Festival de Cannes, chega finalmente até ao público nacional como um testamento mais definitivo e completo sobre o tema.
À primeira vista, parece-nos uma história de passagem de idade comum, onde um trio de adolescentes britânicas decide viajar para Creta e aí exorcizar as pressões que as prendem na terra natal – nomeadamente a entrada (ou não) para o ensino superior, no fundo, o momento decisivo em que jovens são forçadas a ser vistas como gente contributiva para a sociedade. E claro, é também a idade onde a educação sexual – ou ausência dela! – se revela, pois, por muito que se vanglorie dos feitos e de quem já se “comeu”, há muita falta de experiência – o sexo como ato não conta como maturidade. E é nestas águas turvas, onde o desejo da primeira vez é tão grande que até vai permitindo cedências, que navega “How to Have Sex”.
Longe de querer fazer do filme um manual como o título parece indicar, Walker lança questões importantes para nós, para o nosso adolescente do presente ou passado, conforme a idade. Será que o desejo adolescente justifica aceitar tudo? Será que antes de financiar os adolescentes para viajarem enquanto finalistas para o estrangeiro não terá o Estado que intervir em fornecer educação sexual obrigatória? Muitos tiveram uma experiência semelhante – se não foi numa ilha grega, foi na casa de banho de uma discoteca lusitana, ou até na casa do violador, por exemplo. Outros irão ainda experienciar algo semelhante. E portanto, apesar da ausência de um efeito “after school”, talvez seja este o filme certo para mostrar em aulas de Cidadania futuras…
Walker tem como trunfo adicional um elenco de relativos desconhecidos num “casting” praticamente perfeito – justamente nomeado para os BAFTA, onde há um nome que merece ser destacado, o da protagonista Mia McKenna-Bruce, que quer siga em frente ou não, fica já na memória coletiva do pouco público que este filme consiga ter.
De realçar que, pese sempre o naturalismo da abordagem aqui, e talvez por causa disso, há uma imagem que me assombra meses depois de o ter visto e parece até associada a um qualquer filme de “zombies”. Nas primeiras horas da manhã, uma cidade outrora repleta de música de DJs e de hormonas aos pulos encontra-se suja e despida. O aparente paraíso vira cenário de terror. E sim, é uma imagem que resume muito bem a narrativa principal (embora o filme ofereça um conforto final de que pode ainda tudo melhorar) e também a narrativa escondida – o jogo de classes que invade igualmente o nosso território nacional com os efeitos da gentrificação sazonal e os excessos facilmente cometidos.
É portanto um falso filme simples, executado por uma principiante que traz uma experiência – infelizmente vivida na primeira pessoa- que falta a muitos veteranos.